Viúva de gari sobre delegada: ‘Antes do Renê atirar, ela atirou primeiro’
Liliane França da Silva estava em protesto por justiça realizado nesta quinta-feira, quando a morte de Laudemir de Souza Fernandes completa 1 mês
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Siga no"Antes do Renê atirar, ela atirou primeiro dando a arma para ele. Dando legalidade para ele fazer isso. Se ela não tivesse deixado a arma dela disponível para ele, talvez isso não tivesse acontecido", disse Liliane França da Silva, viúva do gari Laudemir de Souza Fernandes.
Ela se refere à delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira, esposa de Renê da Silva Nogueira Júnior — autor confesso do disparo que matou o trabalhador — e proprietária da arma utilizada, de acordo com a Polícia Civil de Minas Gerais.
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A afirmativa de Liliane foi dada em protesto realizado em frente ao Fórum Lafayette do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) nesta quinta-feira (11/9), quando o assassinato do gari, de 44 anos, completa um mês. Foram distribuídas rosas aos presentes, cerca de 15 pessoas, e afixadas faixas com escritos como: "Somos garis, não somos lixo".
No ato, Liliane estava acompanhada de familiares e amigos do Laudemir, além de representantes do Sindicato dos Empregados em Empresas de Asseio, Conservação e Limpeza Urbana (Sindeac). "Estou aqui para pedir justiça mais uma vez, que esse crime não fique impune", disse a viúva ao Estado de Minas.
Em discurso, Liliane afirmou ainda que espera que Renê seja condenado à pena máxima. Ela também disse que está na expectativa pela condenação de Ana Paula. Tiago Rodrigues, gari que estava trabalhando com Laudemir quando ele foi morto, também esteve presente e enfatizou que vai lutar para que a justiça seja feita.
Renê foi indiciado por homicídio duplamente qualificado — por motivo fútil e meio que dificultou a defesa da vítima —, ameaça à motorista do caminhão de coleta e porte ilegal de arma de fogo. Ana Paula foi indiciada por porte ilegal de arma de fogo, conforme previsto na Lei de Desarmamento, por ter cedido ou emprestado sua pistola de uso pessoal para o companheiro.
Garis com medo
No protesto, Liliane afirmou ainda que caso Renê da Silva Nogueira Júnior seja eventualmente condenado, os garis de BH vão se sentir mais seguros para trabalhar, visto que Laudemir foi alvejado enquanto fazia algo corriqueiro na rotina dos garis: estava recolhendo o lixo enquanto o caminhão estava parado. “A insegurança aumentou, ela já existia, [mas] antigamente era só ameaça. Agora não, houve um assassinato. Eles estão trabalhando com medo, com muito receio, não é bom”, disse a viúva.
Douglas Pereira Oliveira, de 38 anos e coletor de resíduos há 19, afirmou que o medo acompanha os garis no trabalho. “Começamos a sentir uma sensação de impotência porque a gente passa por isso todo dia, todo dia um ‘apressadinho’ quer passar e fala assim: ‘Eu vou passar por cima’, ‘tira o caminhão de lixo que eu quero passar’, contou ele, que não trabalhou diretamente com Laudemir, mas o conhecia.
Valorização dos profissionais da limpeza urbana
A Superintendência Regional do Trabalho de Minas Gerais, cujo representante estava no protesto desta quinta-feira, lançou uma campanha pela valorização e respeito aos profissionais da limpeza urbana em Belo Horizonte. “Para que a partir do que aconteceu com Laudemir, a população da cidade possa olhar para o gari, para aquele que cata nosso lixo, com mais respeito. A cidade depende deles", afirmou Carlos Calazans ao Estado de Minas.
O superintendente também explicou que a campanha faz um apelo para que a população tenha consciência na hora do descarte dos resíduos, ação que pode ocasionar em um outro tipo de violência aos trabalhadores. “Muitas vezes nós colocamos dentro do nosso lixo vidros, cacos de vidro, copo quebrado, lata que cortam as mãos, e os garis chegam para pegar aquele material e jogar no caminhão e se ferem, se machucam”, disse. Calazans também afirmou que a campanha pede por uma cidade mais limpa.
Delegada permitia uso de armas
O inquérito também revelou que a delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira permitia que o esposo utilizasse as armas dela. “Tanto a pistola glock calibre .380, usada para a prática de crime, como também a pistola glock, calibre 9 mm pertencente à carga da PCMG”, consta no documento.
Exames periciais realizados entre duas munições apreendidas no local do crime tiveram compatibilidade com a pistola calibre .380 apreendida na casa da servidora pública.
Como foi o crime?
No dia 11 de agosto, Laudemir trabalhava, junto com outras quatro pessoas, na Rua Modestina de Souza, por volta das 8h55, quando a motorista do caminhão, uma mulher de 42 anos, parou e encostou o veículo para que uma fila de dez carros pudesse passar. A via de mão dupla, segundo relato de testemunhas, fica próxima da Avenida Tereza Cristina.
Em determinado momento, o último veículo, identificado como um carro modelo BYD, da cor cinza, teria enfrentado dificuldades para passar pelo caminhão e, por isso, a motorista e um dos garis teriam indicado ao motorista que o espaço seria suficiente.
Em depoimento à Polícia Civil, a condutora do caminhão de coleta, identificada como Eledias Aparecida Rodrigues, afirmou que, enquanto recebia as instruções dos funcionários, o motorista do BYD pegou uma arma preta, fez movimento para engatilhar a arma e, apontando para ela, disse: “Se você esbarrar no meu carro, eu vou dar um tiro na sua cara, dúvida?”.
Diante das ameaças feitas à colega, uma segunda testemunha afirmou que os demais trabalhadores tentaram acalmar o suspeito e pediram que ele seguisse seu caminho. Mesmo assim, segundo o boletim de ocorrência, o homem desembarcou com a arma em punho, deixando o carregador cair. Ele então o recolocou, manobrou a arma e efetuou um disparo em direção à vítima.
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Laudemir chegou a ser socorrido e encaminhado para o Hospital Santa Rita, no Bairro Jardim Industrial, em Contagem, mas morreu.