Ator interpreta vários personagens em ‘A língua do fogo’
No solo, Vinicius de Souza revisita memórias de um homem que tem um "branco" súbito e esquece o próprio nome. Espetáculo estreia neste sábado (13/9)
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Siga noNão um ou dois, mas vários. Ator, diretor, dramaturgo e produtor, Vinicius de Souza se desdobra em muitos personagens para contar sua própria história. Que é dele e dos que vieram antes, mas que também carrega uma boa dose de fabulação. Com estreia neste sábado (13/9), no Teatro de Bolso Sesiminas, o solo “A língua do fogo” é uma espécie de prova dos noves para Souza.
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E também para seu diretor, Paulo André, do Galpão, grupo com quem Souza já assinou alguns trabalhos. A montagem, escrita e interpretada pelo ator, marca a estreia de Paulo André na direção de um espetáculo. No Brasil, diga-se, pois em 2023 ele codirigiu no México, com Rafael Bacelar, “Gente”, espetáculo produzido pelo Teatro UNAM – Centro Universitário de Teatro e Sistema de Teatros da CDMX.
“A língua do fogo” vem a público com um terceiro nome no núcleo central: o artista multimídia João Marcelo Emediato divide a direção com Paulo André. A parceria se deu porque o ator concebeu a encenação com Souza e acompanhou os ensaios durante um bom período, mas depois teve que se ausentar.
Está, atualmente, em Bonito, cidade serrana no agreste pernambucano, conhecida por suas cachoeiras. Neste cenário, Paulo André roda “O rio” (título provisório), novo filme do cineasta Hilton Lacerda, como protagonista.
Esquecimento
No monólogo autoficcional, Souza surge em cena como um professor. Durante uma aula, ele esquece o próprio nome. Para tentar recuperá-lo, embarca em uma viagem pelo inconsciente, visitando alguns “fantasmas”, pessoas de seu passado, das histórias que o constituíram.
Souza nasceu no bairro Industrial, em Contagem, onde sua família se radicou, ao chegar à Região Metropolitana, vinda do interior. “Meus últimos espetáculos [‘O maior trem do mundo’ e ‘Os terrestres’, de 2023 e 2024, respectivamente] falam do interior de Minas Gerais de modos bem distintos. Mas o que acontece quando a gente sai do interior e vai viver nas grandes cidades?”
Foi a partir dessa pergunta que ele começou a pensar na dramaturgia. “São famílias [como a dele] que vivem uma vida em torno de indústrias estrangeiras. Então, a peça adentra em questões do colonialismo, de pessoas que dedicam a vida ao interesse estrangeiro. Ou seja, a história é sempre recolonizada. Falo disso sob a perspectiva doméstica.”
Para a escrita, Souza comenta que a obra do argentino Jorge Luis Borges foi a principal referência. “As histórias estão na peça de um jeito bem onírico, labiríntico. Há cenas estranhas, em que não se sabe se é sonho ou realidade.”
Jantar
A partir do professor, Souza encarna vários personagens. Em uma das cenas, uma família recebe o patrão – um japonês dono da fábrica onde trabalham – para jantar. “É uma cena ao mesmo tempo engraçada e estranha, pois a família fica tentando agradá-lo. No fundo, isso caracteriza uma grande violência que cidades industriais vivem”, comenta Souza. Nesse momento, ele interpreta três personagens ao mesmo tempo.
E os personagens não são somente os humanos. “Ele faz inclusive o cachorro”, comenta Paulo André, que considera “bonito e emocionante um cara tão jovem ter a coragem de se expor com muita sinceridade e, ao mesmo tempo, estar aberto para ficcionalizar tudo”. Ele lembra que, mesmo que a origem do texto venha da vivência familiar do ator e dramaturgo, tudo que está em cena é ficção.
Quando Paulo André começou a trabalhar com Souza, ele já tinha uma ideia do prólogo e do epílogo, conta o diretor. “Mas não tinha o recheio. Fomos desenvolvendo isso juntos, ele escrevendo a partir dos improvisos e conversas que tínhamos na sala de ensaio.”
Parceria
Os dois já trabalharam juntos em “Três tigres tristes”, texto de Souza encenado por ele, Paulo André, Alexandre Hugo e Marcelo Castro. Souza também dirigiu o Galpão em dois projetos realizados durante a pandemia: o média-metragem “Éramos em bando” e a peça radiofônica “Quer ver, escuta”.
“Isso me deixou em um lugar muito confortável de direção. Como ele escreveu o texto, já tinha muito claro suas intenções estéticas. Mais do que uma direção, ele precisava mais de um olhar externo, pois quando estamos no palco não temos muito a percepção do que está rolando [fora]”, acrescenta Paulo André.
Mesmo à distância, ele tem acompanhado, por meio de vídeos e conversas virtuais, o final do processo de montagem, agora sob as mãos de João Emediato. “Quando viajei, as coisas estavam bem encaminhadas, a proposta de encenação resolvida”, diz Paulo André, que não poderá assistir à estreia de “A língua do fogo”. Mas como a montagem terá agora somente três apresentações, uma nova temporada é mais do que provável.
“A LÍNGUA DO FOGO”
Texto e atuação: Vinícius de Souza. Direção: Paulo André e João Emediato. O espetáculo será apresentado deste sábado (13/9) a segunda (15/9), no Teatro de Bolso – Centro Cultural Sesiminas (Rua Padre Marinho, 60, Santa Efigênia). Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (meia), à venda no Sympla.