"Suçuarana", rodado em BH e Lavras Novas, estreia nesta quinta (11/9)
Premiado filme de Clarissa Campolina e Sérgio Borges trata de temas como precarização do trabalho e a força do feminino. Road movie tem cão como ator
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Siga noVencedor de cinco prêmios no Festival de Brasília de 2024, incluindo Melhor Atriz para Sinara Teles e Ator Coadjuvante para Carlos Francisco, “Suçuarana”, de Clarissa Campolina e Sérgio Borges, chega nesta quinta-feira (11/9) aos cinemas. É um road movie ambientado em Minas Gerais que trata de temas caros ao mundo de hoje, como a precarização do trabalho, coletivo versus individual e a força do feminino.
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Não deixa de ser curioso o ponto de partida ser uma novela britânica de mais de um século atrás, “A fera na selva” (1903), considerada uma das obras-primas de Henry James. Tragédia do autoconhecimento (pois ele só chega quando é muito tarde), acompanha dois personagens, John Marcher e May Bartram, ao longo do tempo.
“É sobre a possibilidade de você deixar algo muito importante, como o amor passar na sua vida, sem que você perceba, por conta de uma obsessão, de algo individualista. Henry James consegue construir um mistério que é muito potente, cheio de imagens, de sombras”, comenta Clarissa.
Ela apresentou a obra a Borges, que não se impressionou no primeiro momento. “Acho que a parceria criativa se faz principalmente na dissidência, no jeito que a pessoa coloca questões que vão te deslocar, de onde, a princípio, você está confortável”, continua ela.
Terra devastada
O projeto foi encampado pela dupla, que desenvolveu o roteiro no chamado Núcleos Criativos, um antigo sistema de fomento da Agência Nacional do Cinema (Ancine). “Ganhamos um prêmio chamado Transcriações, que era de projetos de adaptações da literatura. Mas ele não virou um filme de época, é uma transcriação também”, comenta Borges. “Queríamos um personagem com uma característica animal, mais imprevisível, que a gente não compreende completamente”, continua Clarissa.
“Suçuarana” acompanha Dora (Sinara Teles), jovem que vive em um lugar de Minas Gerais arruinado pela mineração. Ela tem uma única busca na vida – na verdade, uma obsessão. Quer chegar ao Vale do Suçuarana, um lugar remoto e perdido onde sua mãe teria vivido. Sem trabalho, dinheiro ou qualquer vínculo, começa sua jornada. Acaba encontrando companhia em um cachorro que sempre aparece quando Dora menos espera. No caminho, chega até uma vila de trabalhadores de uma fábrica abandonada. Ao perderem os empregos, essas pessoas se sustentam vendendo o antigo maquinário.
O longa foi rodado em Belo Horizonte e seus arredores, como também na estrada que liga a capital a Ouro Preto. Outra locação importante foi o distrito de Lavras Novas.
A devastação causada pela mineração é um cenário muito presente. “Nós, mineiros, vemos a terra desaparecer. E as pessoas são desapropriadas das terras, muitas vezes. Acho que com o crime das mineradoras a gente vê isso muito claramente no nosso presente. E queríamos fazer um filme que dialogasse com o nosso contemporâneo”, explica Clarissa a respeito do cenário, quase distópico.
“Essa distopia a gente já vive no dia a dia, não só em relação ao meio ambiente, mas com as próprias pessoas. Parece que o mundo está numa outra ordem, inclusive outra ordem moral. Fomos nos alimentando da realidade (para criar o roteiro)”, acrescenta a diretora. Borges completa: “No primeiro momento do filme, Dora está sozinha na estrada e tenta pedir ajuda. As pessoas que se encontram com ela também estão precisando se virar. Ela, de um jeito ou de outro, cria uma rede apoiada sempre por mulheres.”
Parte do elenco é formado por membros da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e Santa Efigênia de Ouro Preto. Tais personagens aparecem na segunda metade do longa, quando Dora se vê cada vez mais distante de seu sonho. “Para fazer essa parte, a gente entendeu que não era juntar um grupo de atores incríveis e criar uma comunidade. Fomos atrás de uma comunidade que, de fato, existe, em que as pessoas fazem as coisas juntas”, diz Borges.
Encrenca, o cão
Os créditos iniciais do filme apresentam três nomes: dos supracitados Sinara Teles e Carlos Francisco (que interpreta Ernesto) e também de Tony Stark. O herói Marvel, na verdade, é um cachorro que interpreta Encrenca, que se torna o fiel companheiro de Dora.
O casting para Encrenca (que é como, muitas vezes, Clarissa chama Sérgio Borges) não foi fácil, a diretora explica. Ele foi encontrado pela diretora de produção numa praça de Belo Horizonte, brincando com sua tutora, uma veterinária.
“Não queríamos um ator treinado para o cinema porque não tínhamos orçamento para isso e também porque não queríamos um cachorro tão adestrado. Fizemos testes com alguns e o Tony foi perfeito. Foi curioso porque a Sinara não tem muita relação com cachorro, então teve que conquistá-lo. E ele a ela também”, finaliza Clarissa.
Sessão dupla
Nesta sexta (12/9), “Suçuarana” terá sessão dupla no UNA Cine Belas Artes. O filme será exibido às 20h30 nas salas 2 e 3. Haverá apresentação da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e Santa Efigênia de Ouro Preto. Ingressos: R$ 10 (válido somente para as duas sessões).
“SUÇUARANA”
(Brasil, 2024, 85min.). Direção de Clarissa Campolina e Sérgio Borges, com Sinara Teles e Carlos Francisco. Estreia às 18h40, no Centro Cultural Unimed-BH Minas 2, e às 19h, no UNA Cine Belas Artes 3.