
Tornozeleira: aliada ou muleta?
A literatura médica reforça que a tornozeleira tem papel importante na prevenção de recidivas e no retorno ao esporte
Mais lidas
compartilhe
SIGA NO

Poucos acessórios despertam tantas dúvidas no consultório de ortopedia e fisioterapia quanto a tornozeleira. Esse suporte simples, feito de tecido elástico, neoprene, tiras ajustáveis ou estruturas mais rígidas, é visto ao mesmo tempo como um amparo indispensável e como um possível vilão da recuperação. Afinal, a tornozeleira ajuda ou atrapalha? É aliada ou muleta? Para responder a essa questão, precisamos compreender a função desse dispositivo, o contexto em que é indicado e os riscos do uso indiscriminado.
A função da tornozeleira
O tornozelo é uma das articulações mais exigidas do corpo humano. Ele sustenta o peso corporal, absorve impacto a cada passo e precisa ser estável o suficiente para garantir segurança em mudanças bruscas de direção, mas ao mesmo tempo flexível para permitir corrida, saltos e movimentos finos. Quando ocorre uma entorse – especialmente aquela em que os ligamentos laterais se estiram ou rompem – a estabilidade da articulação é comprometida. É aí que entra a tornozeleira.
A ideia central é simples: fornecer suporte externo, limitando movimentos que poderiam agravar a lesão e, ao mesmo tempo, transmitir ao sistema nervoso um reforço de segurança. Esse estímulo mecânico e sensorial é chamado de propriocepção, e está diretamente ligado ao equilíbrio.
Quando a tornozeleira é uma aliada
A tornozeleira pode ser extremamente útil em várias situações.
- Fase aguda de lesão ligamentar
- Retorno ao esporte
- Prevenção em tornozelos instáveis
- Atividades do dia a dia
Se usada de maneira indiscriminada, a tornozeleira deixa de ser aliada e passa a representar um risco. Isso acontece por alguns motivos:
- Falsa sensação de segurança
- Atrofia muscular e dependência
- Uso sem indicação
- Ortopedia no esporte amador e profissional: o que muda?
- Crescimento e atividade física: como orientar crianças e adolescentes
O que dizem os estudos científicos
A literatura médica reforça que a tornozeleira tem papel importante na prevenção de recidivas e no retorno ao esporte, especialmente em atletas de quadra. Revisões sistemáticas apontam que ela pode reduzir em até 50% o risco de uma nova entorse em indivíduos já lesionados.
Por outro lado, não há evidência de que o uso indiscriminado previna lesões em pessoas sem histórico prévio. Além disso, trabalhos de longo prazo indicam que a reabilitação ativa, com fortalecimento muscular e treino proprioceptivo, é mais eficaz do que a simples dependência de suportes externos.
Tipos de tornozeleiras e suas indicações
- Elásticas simples: indicadas para leve compressão, conforto e pequeno suporte. Úteis em casos leves e no dia a dia.
- Neoprene: oferecem maior compressão, auxiliam na redução de edema e na sensação de firmeza.
- Com tiras ajustáveis (estilo figure-of-eight): aumentam a estabilidade lateral, sendo indicadas no retorno esportivo.
- Rígidas (com hastes plásticas): recomendadas em entorses graves ou em fases iniciais, quando se deseja limitar movimentos.
A escolha depende da gravidade da lesão, do momento da reabilitação e da necessidade específica do paciente.
Leia Mais
O equilíbrio entre suporte e autonomia
A grande questão não é se a tornozeleira é boa ou ruim, mas como e quando utilizá-la. Na prática clínica, a melhor estratégia é combiná-la com um programa bem estruturado de fisioterapia, incluindo exercícios de mobilidade, fortalecimento de músculos peroneais, treino de equilíbrio em superfícies instáveis e progressão para movimentos funcionais.
Assim, a tornozeleira funciona como apoio temporário, não como substituto da reabilitação. É um recurso que dá tempo para que o corpo se reorganize, mas que deve ser abandonado à medida que a articulação recupera estabilidade natural.
A visão do paciente e do médico
O simbolismo da tornozeleira também precisa ser considerado. Para muitos pacientes, ela representa segurança psicológica. Saber que existe uma camada de proteção traz confiança, reduz medo de novos episódios e favorece o engajamento em atividades físicas.
Cabe ao médico e ao fisioterapeuta orientar: usar quando necessário, retirar quando não for mais indicado e explicar que a verdadeira recuperação vem do fortalecimento interno. A educação do paciente é, nesse contexto, tão importante quanto o tratamento físico.
Tornozeleira e performance esportiva
Há ainda o debate sobre impacto na performance. Alguns atletas relatam que a tornozeleira limita a agilidade, outros sentem melhora por se sentirem mais firmes. Estudos biomecânicos indicam que o efeito na velocidade e salto é mínimo, mas o ganho em estabilidade pode compensar em modalidades de alto risco de entorse.
Em corridas de rua, por exemplo, a tornozeleira pode ser dispensável, a não ser em casos de instabilidade prévia. Já em esportes coletivos, como o basquete, seu uso temporário pode ser estratégico.
Mensagem final para o leitor: se você sofreu uma entorse ou sente insegurança no tornozelo, não compre uma tornozeleira por conta própria. Procure avaliação médica e fisioterapêutica. O acessório pode ser útil em um momento específico, mas o que vai garantir sua recuperação e prevenir novas lesões é um programa individualizado de exercícios e reabilitação ativa.
Quer mais dicas sobre esse assunto? Acesse: www.tiagobaumfeld.com.br ou siga @tiagobaumfeld
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.